O ano de 2020 trouxe inúmeros desafios para o ensino, que passou a ser remoto, por conta da pandemia. Para a disciplina de Artes Visuais, o desafio foi pensar e fazer arte longe do espaço dos ateliês e sem a disponibilidade de materiais e ferramentas próprias. Mas, para os alunos do 9º ano, isso não se mostrou um impeditivo. “Ao contrário: da adversidade se potencializou a reflexão criativa”, explica o professor Carlos Augusto Cabral Arouca. “Intervenções no espaço da casa de cada um realizaram ressignificações poéticas, transformando o trivial em composição artística. Por exemplo, um piso em construção que se transforma em fumaça, uma rede de repouso que vira rede de pesca…”
Tão longe e tão perto
A produção artística ocupou o ambiente doméstico, mas também chegou ao Colégio. “Distantes fisicamente e tão próximos como identidade, os alunos do 9º ano puderam voltar a escola, ainda que virtualmente, para marcar sua mensagem em paredes emblemáticas da escola, como a da cantina do Ensino Fundamental, a do ginásio e a da nova biblioteca”, conta Arouca. Usando recursos tecnológicos, os trabalhos foram “aplicados” nas imensas paredes. “O desafio apresentado foi que a imagem deveria dialogar diretamente com o local em que está inserida, aprofundando, desta maneira, o conceito contemporâneo de site specific.* “Cada parede foi se transformando em obra de arte, sob os olhos de quem está encerrando uma etapa e partindo para um novo ciclo.”
*O conceito de “site specific” remonta às experiências de intervenção em espaços naturais ou urbanos nos anos 60 e 70. São obras que configuram uma situação espacial específica, levando em conta as características do local, e que não podem ser apreendidas senão ali. (Fonte: Folha de S. Paulo)
Anna Andrade, Helena Santos, Mariana Ticoulat, Sarah Noya
Quando as artes olham para as outras matérias
Representar os aprendizados com olhos de artista. Foi com este desafio que os alunos do 9º ano escolheram temas de interesse próprio, que foram discutidos nas diferentes disciplinas, como elemento disparador para criações artísticas. “Matérias como História, Ensino Religioso e Português, foram reinterpretadas de diferentes maneiras no campo do simbólico, reafirmando olhares atentos e sensíveis na contemporaneidade”, compartilha Arouca.
Com a palavra (e a imagem), os alunos:
“Eu utilizei o vidro, com formato semelhante a uma lupa, para dificultar a leitura de um texto do livro “Reprodução”, de Bernardo Carvalho. Eu quis fazer dessa forma pois indica uma contrariedade, já que a lupa supostamente serve para enxergar melhor, e neste caso está atrapalhando. Isso faz um contraponto com o que o livro procura criticar”, explica a aluna Helena Bourgogne.
“Eu busquei retratar, a partir de uma encenação/performance, uma representação da crise do coronavírus em nossa realidade. Nas antigas guerras, como as estudadas ao longo do curso de História, os soldados mortos em combate eram cobertos por lençóis brancos e, tempos depois, carregados para suas sepulturas. Essa imagem dos lençóis me chamou muita atenção, por dar uma sensação de falta de identidade aos mortos, que são cobertos e esquecidos em meio de milhões”, conta a aluna Violeta Ferrari.
“As silhuetas são projetadas por meio da lanterna de celulares na tela do computador – sem a tecnologia no contexto do coronavírus as relações sociais se tornariam praticamente impossíveis. Os “bonecos”, ainda, estão sendo segurados por duas mãos de uma pessoa com proporções reais; o responsável por criar a “ilusão” das relações sociais neste contexto – gostaria de pontuar que, neste ângulo, as mãos parecem ser de qualquer pessoa que observa a fotografia, como se você estivesse atuando sobre ela”, diz a aluna Edith Borges.
“Para esse projeto, fizemos uma uma ruptura no telão para representar o “rasgo” que sofremos tanto em nosso ensino, quanto em todas as nossas relações do dia a dia neste ano. No contexto da pandemia, perdemos todo e qualquer tipo de convivência, tão presente na vida de adolescentes. Nossa formatura, marco tão importante neste processo escolar, foi impedida. Viagens e trabalhos para os quais esperávamos há tanto tempo, cancelados. E o que mais faz falta, a convivência com nossos amigos, pessoas com as quais convivemos desde que somos pequenos”, nos contam Sofia Longo, Ana Beatriz Barroquelo e Livia Barreira, sintetizando sentimentos que apareceram nos trabalhos de muitos colegas.